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Foto do escritorLugana Olaiá

Marque uma reunião com seus fantasmas de estimação

Quando acordar de madrugada e perder o sono, observe seus pensamentos. Há quem consiga esvaziar a mente até um estado tão leve de consciência que o sono pode continuar. E existe um grupo de pessoas que tem suas mentes invadidas por pensamentos dos mais diversos assuntos, numa velocidade tão grande, que se torna um desafio voltar a dormir. Podemos desistir. Nossos corpos são capazes de enviar uma mensagem clara sobre o que precisamos, mas você precisa treinar a escuta ativa da sua voz interior.


Todo mundo sabe que fui diagnosticada com depressão em junho, né? Talvez não todos, mas alguns leitores e seguidores do Instagram podem ter visto o último conteúdo que postei na página. Falar disso aqui, também abrirá espaço para mais julgamentos. Mas não falar sobre isso, me aprisiona nas críticas que eu mesma faço, e na falsa ideia de que eu sou a única mulher preta mãe deprimida.


Eu tenho vergonha. Mas uma parte de mim acredita que essa questão química não é motivo para vergonha. Me sinto fraca, me sinto frágil na fé, me sinto traindo os ancestrais, me sinto em falta com o legado de um povo. Mas tudo isso também é resultado do estado depressivo.


Eu preciso repetir para mim mesma, diante do espelho, que sou humana. Mas é muito complicado manter esse discurso com firmeza, principalmente quando o seu entorno se empenha em dizer o contrário. “Você é uma máquina, trabalhe e não sinta nada! Você é preta, não pode sentir dor com palavras ditas, com olhares, tratamento, com preconceito. Existe racismo na Bahia?” Rsrs


Nunca é um motivo só, mas a sensação de desemparo é talvez a que grita mais alto dentro da sua cabeça. E por se sentir sem apoio, você também acha que não consegue sozinha. Mas é possível. Na verdade, só você mesma é quem precisa fazer a maior parte do esforço.


Ao todo durante os últimos 6 meses, foram 1.170 comprimidos de antidepressivo, e outras drogas. Muitas noites não dormidas, muita mutilação, muita dor, pouca fome, muito sangue. Muitas séries, muita música, pouca água, pouca comida no fogão, muita força, pouca coragem. Mais cortes e feridas e dores.


No meio do caminho a gente tenta respirar. Tentei muitas estratégias, descobri qual é o meu combo de rotina do bem estar. Mas ainda não consigo fazer todos os dias, ainda sofro, agora aceitei que é algo que vou lidar pra sempre. É preciso me perdoar, abraçar quem sou, acolher minhas lágrimas, preciso não me entregar.


Para saber mais:

*Cupboard VIII é uma escultura monumental da artista Simone Leigh feita em 2018. Medindo cerca de 3 metros de altura, mais da metade da altura da escultura consiste em uma estrutura imponente em forma de cúpula que fica plana no chão. Toda a superfície desta estrutura é coberta por quatro camadas sucessivas de ráfia, o que lhe confere a aparência de um telhado ou edifício de palha, aludindo ao interesse de Leigh pela arquitectura vernácula do Norte e da África Ocidental.

Do topo desta estrutura abobadada emerge um torso feminino nu, cujos braços estão estendidos para a frente num ângulo de cerca de 90 graus. O torso foi construído em grés e esmaltado em uma cor bronze profunda, exibindo o treinamento básico e a habilidade de Leigh como ceramista. Os dedos de cada mão, que apontam para cima e ligeiramente um para o outro, são planos e bem unidos, o que lhes confere uma certa solidez, como se tivessem a capacidade de reter água em caso de chuva.


Embora a maior parte do torso da figura pareça altamente naturalista, há um vaso arredondado no lugar da cabeça da mulher. Este pote tem formato quase esférico e tem cerca de duas vezes o tamanho de uma cabeça humana. Ele é colocado em um leve ângulo sobre o pescoço da figura, de modo que a abertura da borda do vaso se incline para cima e ligeiramente para a frente em um ângulo de 75 graus. Dado que o vaso é ligeiramente mais largo na sua região central, esta inclinação subtil confere ao vaso uma forma quase redonda quando visto de perfil. Como o vaso tem a mesma cor e material de bronze profundo do resto do torso da figura, o vaso parece crescer organicamente a partir do pescoço da figura. Portanto, além da construção quase arquitetônica da escultura, ela também aparece (especialmente de longe) como a figura monumental de uma mulher negra vestindo uma volumosa saia de ráfia.


Como mulher negra e estudiosa do pensamento feminista negro, Leigh frequentemente observou que vê as mulheres negras como os principais sujeitos e público de seu trabalho. Cupboard VIII incorpora as maneiras pelas quais Leigh entrelaça perfeitamente as histórias simbólicas e materiais de opressão, resistência, conhecimento e poder incorporadas na subjetividade da mulher negra, ao mesmo tempo em que coloca em primeiro plano a beleza, a dignidade e a visibilidade de seus temas.



3 Comments


Sensacional do início ao fim. E essa imagem-obra. Foda.

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"Eu tenho vergonha... Me sinto fraca, me sinto frágil na fé, me sinto traindo os ancestrais, me sinto em falta com o legado de um povo." Engraçado como a depressão nos faz ter sensações parecidas. Pouca gente sabe mas também sou diagnosticada com depressão e ja há muito tempo e ontem estava pensando exatamente sobre isso. O sentimento de culpa, vergonha diante da vida. Tanta gente bem nas redes sociais dizendo que é só ser forte, "seja antifrágil" é a nova e a pergunta sempre é: "Porque não consigo também?" Continue escrevendo, falar disso aqui também abrirá espaço para que outras pessoas também possam falar e compartilhar. "Eu preciso repetir para mim mesma, diante do espelho, que sou humana."

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Obrigada pela leitura e por compartilhar sua história Ana! Encarar as comparações com os perfis felizes é uma batalha que sempre perco. Um beijo

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